A princesa Amélia parecia mesmo
irredutível. Ela só aceitaria se casar com o rei Duarte se ele lhe entregasse
um florave, em uma gaiola cravejada de diamantes. A gaiola e os diamantes não o
preocupavam. O grande problema seria encontrar um florave. Ele perguntou ao
homem mais sábio de seu reino: “O que é um florave?” Pensativo, o homem
respondeu: “Eu não sei, Majestade. Mas talvez a feiticeira da floresta possa
ajudá-lo.”
Sem perder tempo, o rei Duarte montou
em seu cavalo negro e seguiu em direção à casa da feiticeira, que ficava no
interior da floresta. Quando o rei perguntou à feiticeira se ela poderia
ajudá-lo a encontrar um florave, eis o que ela respondeu: “Eu tenho um jardim
repleto de floraves. Você pensará que são apenas flores, porque eles perderam as
asas... Mas, sobre cada um deles, paira um desejo. Se você conseguir se
identificar com um desses desejos e consentir que ele crie raízes em seu
coração, ele se transformará em sonho. Se você souber cultivá-lo, ele ganhará
asas e consistência, e você terá o seu florave.”
Visivelmente confuso, o rei
perguntou: “O que devo fazer? Como posso atrair um desejo? Como posso trazer um
florave de volta à vida? O que é um florave? Eu devo colher uma flor e
plantá-la em um vaso? O que acontecerá se...”
Balançando a cabeça para os
lados, a feiticeira exclamou: “Cale-se!... As respostas para essas perguntas
não poderão ajudá-lo... Você precisa aprender a ouvir com o coração. Sente-se à
sombra daquela árvore e sinta a magia que há neste jardim. É só isso!... Confie
e não tente apressar e, muito mesmo, abreviar o encontro com o seu desejo.
Permita que o desejo brote do fundo do seu coração, em vez de fabricá-lo com a
sua mente. E, antes de tudo, tenha a convicção de que você será bem sucedido:
os floraves são alegres, gentis e portadores de sorte.
Por mais de três horas, o rei Duarte
ficou sentado à sombra da árvore, esperando que um desejo despertasse em seu
coração. Ele já estava quase desistindo quando, de repente, o inesperado
aconteceu. Ele olhou entusiasmado para a feiticeira enquanto dizia: “Eu já
encontrei o meu desejo, ou foi ele quem me encontrou?!... Não importa!... O que
eu mais quero é...” Para evitar que ele continuasse, a feiticeira exclamou:
“Cale-se!... Do contrário, o seu desejo perderá o encanto.”
Quando o rei Duarte retornou ao
castelo, já havia anoitecido. Um de seus criados foi ao seu encontro para
dizer: “Majestade, eu sinto muito, mas aconteceu novamente. Aquele ladrãozinho
é muito esperto!... Com esse já são três pássaros que desaparecem em menos de
uma semana.” O rei perguntou: “Dentro da gaiola, havia novamente o bilhete?”
Solícito, o criado entregou o bilhete ao rei enquanto dizia: “Aqui está ele. Os
três bilhetes possuem os mesmos dizeres: ‘Este pássaro é livre. Vossa Majestade
não tem o direito de mantê-lo trancado nesta gaiola.’”
O rei comentou pensativo: “Um
ladrão não teria escrito isso. Sinta o perfume!... Eu quero descobrir quem é a
mulher que está libertando os meus pássaros.” O criado balbuciou timidamente:
“Eu não havia cheirado o bilhete... Eu tenho quase certeza que sei quem o
escreveu. Mas, por favor, Majestade, não me obrigue a dizer o nome dela.”
O rei Duarte fixou o olhar no
rosto do criado. Ele abaixou os olhos antes de dizer: “O perfume se parece
muito com a fragrância que minha filha usa, e a caligrafia, depois que a
observei melhor, também parece ser dela. Vossa Majestade sabe que somos pobres
e jamais poderíamos...” Antes que o criado pudesse terminar a frase, o rei
Duarte ordenou: “Junte os seus pertences
e desapareça!... E não se esqueça de levar sua filha com você. Mas antes
traga-a aqui. Eu quero ver se ela terá a ousadia de repetir, na minha presença,
o que escreveu nos bilhetes.”
O criado deixou o salão onde
ficavam as aves raríssimas, que encantavam o rei com os seus cantos melodiosos.
Minutos depois, Rafaela entrou e disse com altivez: “O meu pai disse que Vossa
Majestade desejava falar sobre o desaparecimento dos pássaros. Sou culpada: fui
eu que os libertei. Só lamento ter tido a oportunidade de libertar apenas três
dessas pobres aves!...”
O rei preparava-se para dizer
algo, mas deteve-se quando ouviu a moça exclamar: “Você é mesmo um bárbaro!...
Foi para punir-me que ordenou que eu viesse até aqui?!... Eu libertei uma ave, e você com sua crueldade
trancafiou um florave em seu lugar!...”
Confuso, o rei Duarte olhou para a preciosa gaiola antes de dizer: “Eu
não sei como essa criatura foi parar aí!... Quando você entrou, a gaiola estava
vazia!... Eu consegui!... Agora poderei me casar com Amélia. Faça-me um favor:
diga ao seu pai que vocês estão perdoados e peça a ele que providencie uma
gaiola cravejada de diamantes. Vá logo!... Não precisa me agradecer. Vá! É uma
ordem!... O que está esperando?!...”
Os olhos de Rafaela estavam
colados nos olhos do rei quando ela perguntou: “O que, Vossa Majestade,
pretende fazer com a gaiola?!...” Ele desviou o olhar antes de dizer: “Também
me desagrada prender a criaturinha, mas é com essa finalidade que ela está
aqui. O destino providenciou para que ela viesse ao meu encontro.”
Com lágrimas nos olhos, Rafaela
comentou: “Se foi o destino quem lhe entregou o florave para que Vossa Majestade
pudesse provar o seu amor à princesa Amélia, ele foi duplamente cruel. Em
primeiro lugar, para que os floraves continuem alegres e sejam portadores de
boa sorte, eles precisam permanecer livres. E, em segundo lugar, apenas o
carinho e a ternura podem provar a existência do amor verdadeiro.”
O rei surpreendeu Rafaela quando
disse: “Pode abrir a gaiola e deixá-lo ir. É isso o que você deseja?...”
Rafaela sorriu, e o seu olhar brilhou tanto que se tornou irresistível. Com ar
travesso, ela perguntou: “Posso mesmo?!... Vossa Majestade não se importa?!...”
Ela ficou ainda mais radiante quando o rei disse: “Se você aceitar se casar
comigo, poderá libertar esse florave e todos os pássaros do reino. Você aceita
se tornar minha rainha?!...”
Rafaela já havia aberto a porta
da gaiola, e o florave já poderia ter ido embora... Mas ele resolveu ficar mais
um pouquinho para presenciar o beijo que o rei Duarte e Rafaela trocaram.
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